A Sociedade Paradoxal I

A SOCIEDADE PARADOXAL I (*)

Horas tão amargas quanto inquietas
Tristeza mais que tudo e frustração
Eis o palco onde nós as marionetas
Se movemos num mundo em convulsão...
Os sábios p’ra que servem e os profetas
Se amanhã não sabem já quem são

Quem espera um futuro espera em vão
A Vida no dinheiro não tem futuro
Vivemos a dormir sobre um vulcão
Num mundo cada vez mais inseguro
É forçoso apagar essa ilusão
Neste deserto infinito, ardente e duro

Já não cremos na Esfinge e no Dragão
Somos gente, assaz, civilizada
Mas corremos atrás d’abstracção
A abstracção bendita, a abstracção sagrada
O dinheiro deus da civilização
Que na vida é tudo e o Homem é nada

Tecnicamente no mundo actual
Temos tecnologia e capacidade
P’ra produzir fartura industrial
Como nunca dantes teve a Humanidade
Mas é nesta hora de riqueza material
Que mais a fome avança e a necessidade

Vemos que este modelo não é racional
Que temos de pensar profundamente
Que não é só na rua gritando contra o mal
Que o mal acaba por fugir da gente
Mas que esta sociedade paradoxal
Tem de mudar a base onde está assente

Separados produto e produtor
Posta a mercadoria no Mercado
Ali lhe é atribuído então Valor
E o produto personalizado
Ganha aí um cunho livre e superior
De quem o produziu dissociado

E ei-lo então, senhor e rei, transfigurado
Na abstracção sagrada e colossal
Nas garras insensíveis do Mercado
Onde o dinheiro, mediador comercial
Ao seu jugo o sujeita em todo o lado
Com a sua apetência transversal

E assim o deus dinheiro é desde então
A potência suprema e opressora
Que trás o Homem preso à sua mão
É ele o monstro divino que devora
O Homem e a Terra…o Leviatão,
A Medusa antiga que nos apavora

Mas dentro do valor dissociativo
Esgotou o seu percurso e já não tem
Seu valor aparente, excelso, altivo
Que só do produtor humano vem
Que é deveras o gérmen produtivo
Porque o valor não sai de mais ninguém

A técnica moderna manda pôr
A máquina no lugar da produção
Mas sem o Homem produtor
Expôs-se a nudez da abstracção
O Mercado paralisa sem valor
E o dinheiro perde aí sua função

(*) Falta de nexo ou de lógica
LEONEL SANTOS
Maio, 2012

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